Wednesday, November 30, 2005

Fernando Pessoa

1935, 30 de Novembro. Inquieto, a remexer-se na cama, Pessoa arde em febre.

Não sou nada
Nunca serei nada
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Estou hoje vencido, como soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer.

O capelão tenta acalmá-lo. Ele insiste em chamar Caeiro, Reis, Campos e Soares. Como que ouvindo o chamamento do seu criador, os poetas seguem para o hospital. Pessoa em agonia. Repuxa o lençol, contrai-se. Dá-me os óculos, os meus óculos, pede. Prepara-se para o último olhar sobre a sua criação. E eles que não chegam. Mas pressente, eles vêm, Ah se vêm.
Caeiro, Reis, Campos e Soares entram de rompante. Porém tarde, já morto o poeta. Sobram uns rabiscos num papel:

Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido,
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo.
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.

(retirado de Vidas Lusofonas)

Alguns sites sobre Pessoa: O Major Reformado, Heterónimos, Obra Poética e Casa Fernando Pessoa.

2 Comments:

Blogger Tiago Mendes said...

Gostei de descobrir o Major Reformado. Atencao que o link para a Casa Fernando Pessoa esta' errado :)

9:30 PM  
Blogger José Fernandes dos Santos said...

Obrigado pela dica que me permitiu corrigir o post. Esperemos que o facto das sua obras se terem tornado públicas faça aumentar o gosto pela sua leitura :)

9:06 AM  

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